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Ficção Científica Brasileira
Verbete
A Ficção Científica Brasileira abrange obras que, de uma forma ou de outra, estão relacionadas aos avanços tecno-científicos e aos impactos destes na vida das pessoas e na sociedade como um todo. Este gênero foi, durante muito tempo, marginalizado no Brasil, por ser comumente associado ao desenvolvimento tecno-científico das grandes potências mundiais. Não obstante, ainda no século XIX, muitos autores brasileiros lançaram mão desse gênero para registrar mudanças epistemológicas e para promover reflexões sociais acerca das incertezas decorrentes desses avanços (Araújo, 2018).
As primeiras manifestações da Literatura de antecipação ou especulativa, no Brasil, foram escritas no século XIX, e serviram de base para a Ficção Científica Brasileira, por isso são colocadas no rol das narrativas de Protoficção Científica: O Fim do Mundo (1857) e A Luneta Mágica (1869), de Joaquim Manuel de Macedo, O Doutor Benignus (1875), de Augusto Emílio Zaluar, O imortal (1882) de Machado de Assis, Demônios (1893), de Aluísio Azevedo e Rainha do Ignoto (1899), de Emília Freitas, dentre outras.
Embora a estruturação do gênero Ficção Científica tenha ocorrido somente em meados do século XX, nas primeiras décadas deste século, escritores bastante conhecidos por outras estéticas literárias, se aventuraram na literatura de antecipação e deram o passo inicial para a formalização do gênero em território nacional. Neste período, destacamos: Esfinge (1906), de Coelho Neto; A era do automóvel, A fome negra e O dia de um homem em 1920 (1911), de João do Rio; O Reino de Kiato (1922), de Rodolpho Theophilo; A Amazônia misteriosa (1925), de Gastão Cruls; O Presidente negro/O choque das raças (1926), de Monteiro Lobato, e Sua Excia. a Presidente da República no ano 2500 (1929), de Adalzira Bittencourt; Morfina e Os Olhos que Comiam Carne (1932), de Humberto de Campos, dentre outros.
Os estudos da Ficção Científica Brasileira são comumente divididos por ondas, termo adotado pelas críticas Andrea L. Bell e Yolanda Molina-Gavilán, em Cosmos Latinos: An Anthology of Science Fiction From Latin America and Spain (2003) e seguidos por importantes críticos, tais como Alexandre Meireles (2019), M. Elizabeth Ginway (2005), Ramiro Giroldo (2012) e Roberto de Sousa Causo (2013).
A Primeira Onda da Ficção Científica Brasileira, também conhecida como "Geração GRD", é marcada pela contribuição do editor Gumercindo Rocha Dorea, responsável pela popularização de muitos dos nomes da Ficção Científica Brasileira. Em 1960, são publicados Eles herdarão a Terra (1960), de Dinah Silveira de Queiroz e As noites marcianas (1960), de Fausto Cunha. Em 1961, as Edições G.R.D. publicaram a pioneira Antologia brasileira de ficção científica, trazendo apenas autores nacionais: André Carneiro, Antônio Olinto, Clóvis Garcia, Dinah Silveira de Queiroz, Fausto Cunha, Jeronymo Monteiro, Rubens Teixeira Scavone e Zora Seljan, dentre outros. Ainda na década de sessenta, destacamos: Diário da nave perdida (1963) e O homem que adivinhava (1966), de André Carneiro.
Durante os anos 70, importantes distopias (subgênero da Ficção Científica) foram escritas, dentre elas destacamos Fazenda Modelo (1974), de Chico Buarque, Um dia Vamos rir de tudo isso (1976), de Maria Alice Barroso, Umbra (1977), de Plinio Cabral e Asilo nas Torres (1979), de Ruth Bueno, dentre outras.
A Segunda Onda da Ficção Científica Brasileira abrange as obras escritas nas décadas de 1980 e 1990. Neste período, destacam-se escritores como, Ivan Carlos Regina, Carlos Orsi, Cid Fernandez, Finisia Fideli, Gerson Lodi-Ribeiro, Ivanir Calado, Jorge Luiz Calife, Roberto Schima, Roberto de Sousa Causo, Ruth de Biasi e Sylvio Gonçalves, Otávio Aragão, Alfredo Sirkis, Fausto Fawcett, Marcia Kupstas e Bráulio Tavares, dentre outros. Neste período, destacamos as obras Espinha Dorsal da Memória (1989), de Bráulio Tavares, conhecido nacional e internacionalmente e ganhador do ganhador do Prêmio Nova de 1989, com o conto “Sympathy for the Devil”.
A Terceira Onda da Ficção Científica Brasileira abrange as obras escritas a partir de 2000, ou seja, a atual geração de escritores. Fortemente influenciados pelas mídias digitais, esses escritores passam por um processo de transição e adaptação, possibilitando o surgimento de novos estilos e estéticas, além de acompanharem tendências estrangeiras como New Weird, Cyberpunk, Steampunk, Retrofuturismo e Afrofuturismo. São representantes desta fase, além daqueles da Segunda Onda, jovens escritores como Jean Gabriel Álamo, Lídia Zuin, Lu Ain-Zaila, Ana Cristina Rodrigues, Walter Cavalcanti Costa, A. Z. Cordenonsi, Ursulla Mackenzie e Enéias Tavares.
Embora as produções literárias de Ficção Científica Brasileira tenham seguido, ao longo do tempo, tendências e modelos internacionais, sobretudo Anglo-Americanos, é possível perceber, nesta terceira onda, um certo desapego das características estrangeiras conferindo aspectos distintivos da cultura e sociedade brasileira em meio as transformações e mudanças geradas pelos avanços tecnocientíficos.
Temas
Temas Transversais
Referências
BELL, Andrea L., MOLINA-GAVILÁN, Yolanda. (Eds.). Cosmos Latinos: An Anthology of Science Fiction from Latin America and Spain. Middleton, CT: Wesleyan University Press, 2003.
CAUSO, Roberto de Souza. Ficção científica, fantasia e horror no Brasil: 1875-1950. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.
GINWAY, M. Elizabeth. Ficção Científica: Mitos Culturais e Nacionalidades no País do Futuro. São Paulo: Devir, 2005.
MATANGRANO, Bruno Anselmi & TAVARES, Enéias. Fantástico brasileiro: O insólito literário do Romantismo ao Fantasismo. Curitiba, PR: Arte & Letras, 2018.
SILVA, Alexander Meireles da. O admirável mundo novo da República Velha: O nascimento da ficção científica brasileira no começo do século XX. 2008. Tese (Doutorado em Literatura Comparada) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008.
Textos traduzidos
Rachel Haywood Ferreira. The Emergence of Latin America Science Fiction. Middletown, Connecticut: Wesleyan University Press, 2011.
M. Elizabeth Ginway. Brazilian Science Fiction. Cultural Myths and. Nationhood in the Land of the Future. Lewisburg: Bucknell. University Press, 2004.
Ginway, M. Elizabeth (2015) "The Amazon in Brazilian Speculative Fiction: Utopia and Trauma," Alambique. Revista académica de ciencia ficción y fantasía / Jornal acadêmico de ficção científica e fantasía: Vol. 3 : Iss. 1 , Article 3.
Autor/a do verbete
Naiara Sales Araújo. Ilustração: Rodrigo Rosa.